Uma notícia despertou muito o interesse da mídia esta semana: o anúncio da compra de 5% do Nubank pela gigante chinesa Tencent, dona do famoso app WeChat. Trata-se de um aplicativo usado por mais 1 bilhão de usuários ativos no mundo (que efetivamente usam o aplicativo diariamente), sendo mais de 100 milhões fora da china.
A Tencent, junto com o Alibaba, provocaram uma verdadeira revolução em meios de pagamentos na China ao eliminar a necessidade do cartão “plástico”. Através do WeChat Pay, a funcionalidade de pagamentos móveis do super aplicativo chinês, o usuário gera ou escaneia um código de barras, eliminando diversos intermediários dos fluxos tradicionais de meios de pagamento (tais como adquirente, bandeira, etc). Na China, o WeChat é conhecido como o ‘app for everything‘ exatamente pela capacidade de agregar uma série de serviços e aplicações em um único aplicativo. Sem sair do app, o usuário pode fazer de tudo: desde pagar contas, solicitar um transporte, reservar uma consulta médica, adquirir um seguro, pagar uma multa de trânsito, até usar o aplicativo para comunicação e mídia social. E esta lista vai muito além.
O segredo do sucesso da Tencent está justamente em alavancar um modelo de plataforma digital, ao permitir integrar de maneira extremamente simples, uma grande variedade de serviços dentro do aplicativo. A empresa ganha ao monetizar (cobrar uma taxa) pelo consumo destes serviços.
Para começar é fundamental conhecer o conceito de Plataforma: Trata-se de um ambiente que facilita a troca de valor entre produtores e consumidores, ou seja entre consumidores e diferentes interessados em novos arranjos (seja uma fintech, uma varejista, ou mesmo uma outra instituição financeira). Um modelo de plataforma, no nosso caso, “conecta” bancos, fintechs e outras instituições e move toda uma indústria, alimentada pelo consumo de serviços financeiros, através da forte colaboração.
Como exemplo de plataformas, podemos destacar empresas como Airbnb e Uber que atuam como “facilitadores” entre os consumidores e os fornecedores dos serviços. No caso do Uber, por exemplo, entre clientes que necessitam do transporte e dos motoristas que precisam ganhar dinheiro. Este modelo de plataforma impulsiona a inovação no setor financeiro ao acelerar a entrega de novos serviços através da colaboração e do estabelecimento de ecossistemas.
A parceria entre NuBank e Tencent desperta forte interesse do mercado exatamente pela possibilidade do Nubank criar e ofertar novos produtos ainda mais disruptivos, alavancando todo o ‘know-how‘ da empresa chinesa. Um cenário possivel, por exemplo, seria a oferta de novas soluções em meios de pagamentos que concorram com empresas tradicionais do ramo de adquirência, tais como Cielo, Rede ou PagSeguro. Com uma base de clientes que já passa 5 milhões de usuários (sendo 2.5 milhões de sua conta digital, a NuConta), o Nubank tem um grande potencial de atrair novos clientes, ou mesmo aumentar o engajamento e relacionamento com os usuários atuais, caso o banco opte por agregar outros serviços financeiros em seu app. Quem sabe este processo pode até acelerar o seu movimento para tornar-se um banco digital completo?
Mas afinal, como as instituições financeiras tradicionais podem se fortalecer e competir neste novo cenário? A resposta está em adotar um modelo de plataforma e uma estratégia Open Banking. Caso ainda não conheça o Open Banking, um bom ponto de partida é o artigo de introdução ao tema ‘O que é Open Banking‘.
A estratégia de plataforma permite que as instituições financeiras ofereçam novas soluções inovadoras, desenvolvidas pelo ecossistema (uma fintech, por exemplo) diretamente em seu próprio ambiente. Desta maneira elas conseguem acelerar o passo da inovação e oferecer novas experiências aos consumidores com muito mais velocidade (e com custos controlados), do que normalmente o fariam caso desenvolvessem sozinhas, com desenvolvimento e equipes internas.
Um modelo de plataforma implica em uma mudança de paradigma e de postura: da oferta de produtos massificados (feito para as massas, no estilo quanto “mais melhor”), para um modelo de serviços escaláveis e extremamente personalizados, de classe mundial.
A estratégia Open banking é pois um forte acelerador para estes novos modelos de plataforma, impulsionando a inovação.
Mas afinal, como as instituições financeiras tradicionais podem se beneficiar do Open Banking, neste contexto? Cito algumas estratégias:
- Ao acelerar o oferta de novos produtos e serviços através de parcerias com as Fintechs, sendo que estas tornam-se responsáveis pelo relacionamento com o cliente final e pela distribuição do(s) produto(s). Outra opção é o próprio banco oferecer o novo produto, em seus próprios canais, através da incorporação de uma solução pronta, em um modelo “whitelabel” oferecida por uma Fintech. Ao incorporar a solução, o banco pode continuar responsável pela distribuição do produto e por manter o controle da experiência do cliente.
- Ao permitir que a Instituição financeira possa estender sua presença digital, oferecendo ao cliente uma combinação de produtos próprios, assim como originados do ecossistema (produtos de terceiros), em uma única interface centralizada. Esta abordagem permite oferecer mais conveniência, além de novas opções, aprimorando a experiência do cliente.
- Ao utilizar insights de clientes, através da troca de informações entre os parceiros de negócios (e todo o ecossistema), ao permitir conhecer melhor o cliente e retomar o controle da jornada do cliente. Neste caso o banco continua com o relacionamento com o cliente e pode oferecer produtos baseados nestes insigths (tais como perfil do cliente, propensão de consumo, etc). Para tal, deve alavancar o uso de tecnologias analíticas, de inteligência artificial e Machine learning.
- Ao acelerar a estratégia da instituição financeira para se transformar em uma plataforma digital, alavancando o relacionamento com o cliente, atuando como um “facilitador” ao conectar consumidores e interessados em novos arranjos. O Banco pode, por exemplo, oferecer um marketplace de serviços (bancários e não bancários) dentro do próprio site ou aplicativo do banco, através da curadoria de produtos de fintechs confiáveis.
- Ao oferecer para o ecossistema novos serviços e monetizar o consumo dos mesmos. Como exemplo de serviços temos; Scoring, segurança, autenticação, Know Your Customer (KYC), entre outros.
E existe risco para as instituições financeiras ao adotar este modelo? A resposta é sim. Entre eles podemos citar:
- Risco de canibalização, uma vez que bancos podem distribuir produtos que possam competir com as próprias ofertas existentes.
- Risco de erosão de margens, já que os clientes podem optar por novos produtos e serviços com taxas mais competitivas
E claro, ao não adotar o modelo existe também o risco de mercado, o que pode implicar em maiores prazos para lançar produtos e serviços (e perder o “timing” de mercado), maiores custos de desenvolvimento interno, ou simplemente perder o passo da inovação. O ambiente de negócios está cada vez mais complexo e competitivo, encontrar o equilíbrio correto entre flexibilidade, velocidade de mudança e inovação são fundamentais.
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